Estudo da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) mostrou que o canabinóide, substância que pode ser encontrada em plantas do gênero cannabis, podem auxiliar no tratamento de doenças neurológicas e psiquiátricas. A descoberta foi feita por pesquisadores do Laboratório de Neuroproteômica, do Instituto de Biologia (IB), e publicada hoje (27) na revista European Archives of Psychiatry and Clinical Neurosciences.
“A gente sabe muito sobre o
efeito dos canabinóides, endocanabinoides ou sintéticos sobre os neurônios.
Estamos aprendendo agora que essas substâncias também atuam sobre as células da
glia”, diz Daniel Martins-de-Souza, um dos pesquisadores. Ele explica que
o nome glia significa cola em grego, porque, no passado, os pesquisadores
achavam que essas células ligavam os neurônios uns nos outros, funcionando
apenas como células de suporte.
Nas últimas duas décadas, no
entanto, estudos mostraram que elas praticam funções importantes no cérebro. A
pesquisa analisou a interação de uma dessas células da glia, chamada
oligodendrócito, com os canabinóides. O oligodendrócito é responsável por
produzir a bainha de mielina, que faz o “encapamento” dos axônios, que são o meio
de comunicação entre os neurônios. “Para o neurônio conseguir conversar
com outro por meio de impulsos elétricos, ele precisa de um encapamento no
fio, vamos assim dizer”, explica o estudioso, comparando com os fios de um
poste de energia elétrica.
Falhas nas células da glia
podem causar doenças. “A bainha de mielina é destruída, por exemplo, na
esclerose múltipla, eventualmente até na doença de Alzheimer. Então, a bainha
de mielina é bastante importante para que o neurônio funcione. A gente sempre
teve uma visão muito neurocêntrica, ou seja, muito da importância do neurônio
no cérebro, mas ele não vai funcionar bem se as células acessórias dele também
não funcionarem, como é o caso do oligodendrócito”, acrescenta
Martins-de-Souza.
Com a análise in vitro,
os pesquisadores viram que os canabinóides promovem a proliferação dos
oligodendrócitos. “Todas as eventuais doenças que têm perda de oligodendrócitos
poderiam se beneficiar”, afirma o especialista. Ele destaca que estudos com
animais e humanos devem confirmar esses dados. A pesquisa também mostrou que,
com os canabinóides, os oligodendrócitos amadurecem melhor. “Isso abre novas
avenidas pra gente investigar potenciais tratamentos de doenças.”
Depressão e esquizofrenia
são outras doenças que podem se beneficiar dessa descoberta.
O que são canabinóides
Além do canabinóide extraído
de plantas do gênero cannabis, o canabidiol, o próprio organismo humano
produz a substância, chamada endocanabinóide. “Foi descoberto que os
compostos da cannabis se ligam a receptores no cérebro, que passaram
a ser conhecidos como receptores canabinóides. O que a gente descobriu a
posteriori é que o nosso organismo produz substâncias que interagem com esses
mesmos receptores. Tudo isso é chamado de canabinóide”, explica o pesquisador.
O estudo, portanto, utilizou
tanto compostos extraídos de plantas do gênero cannabis, como o
canabidiol, o endocanabinóide, quanto sintéticos.