Como muitos de nós, passo
tempo demais no meu celular. E, como muitos de nós, sou totalmente consciente e
costumo me sentir culpada por isso.
Às vezes, deixo o telefone no
outro lado da casa ou o desligo, para usar menos. Mas, no fim, acabo
atravessando o corredor mais cedo do que gostaria de admitir, para fazer algo
que só posso fazer com o celular – ou que ele me permite fazer com mais
eficiência.
Preciso pagar uma conta?
Celular. Marcar para tomar café com uma amiga? Celular. Mandar mensagem para a
família que mora longe? Celular.
Verificar a previsão do tempo,
anotar uma ideia de reportagem, tirar uma foto, fazer um vídeo, criar um álbum
de fotos, ouvir um podcast, pegar indicações de trajeto, fazer um cálculo
rápido... até acender a lanterna? Celular, celular e celular.
Um estudo recente concluiu que
os adultos norte-americanos consultam seus celulares, em média, 344 vezes por
dia – uma vez a cada quatro minutos. Ao todo, eles passam quase três horas por
dia nos aparelhos.
O problema, para muitos de
nós, é que uma tarefa rápida no celular leva a uma rápida verificação do e-mail
ou das redes sociais. Até que, de repente, você acaba sendo sugado pela tela
que rola sem parar.
É um círculo vicioso. Quanto
mais úteis são os nossos celulares, mais nós os usamos. Quanto mais os usamos,
mais caminhos neurais criamos no nosso cérebro para nos fazer pegar o telefone
para qualquer tarefa que surja – e mais vontade sentimos de consultar o
aparelho, mesmo quando não precisamos.
Há 50 anos, Martin “Marty”
Cooper fez a primeira chamada de um telefone móvel. Ele mesmo fabricou o
aparelho – um telefone bege, do tamanho de um tijolo, muito diferente dos
smartphones atuais, que são finos e revestidos de vidro.
O aparelho de Cooper não tinha
câmera e não enviava mensagens de texto. Sua bateria permitia apenas 30 minutos
de conversa – e levava 10 horas para carregar. Hoje, ele não pensa nos
smartphones modernos como um aparelho para fazer chamadas telefônicas.
“Realmente, ele não é um telefone
muito bom em muitos aspectos”, afirma Cooper. “Pense um pouco. Você pega um
pedaço de plástico e vidro, que é plano, e coloca contra a curvatura da sua
cabeça. Sua mão fica em uma posição desconfortável.”
Deixando de lado essa
dificuldade e as preocupações com aspectos específicos do nosso mundo
hiperconectado (como as redes sociais, com seus filtros de beleza cada vez mais
realistas), o que a nossa dependência do telefone celular está fazendo com os
nossos cérebros? Tudo é ruim ou existe algum aspecto positivo?
Cérebro ‘drenado’
É fácil imaginar que, com a
nossa dependência dos aparelhos cada vez maior ano após ano, as pesquisas
enfrentem dificuldades para acompanhar esse crescimento. O que sabemos é que a
simples distração de verificar o celular ou observar uma notificação pode
trazer consequências negativas.
Também não é algo muito
surpreendente, mas já que sabemos que, em geral, a realização simultânea de
várias tarefas prejudica nossa memória e desempenho.
Um dos exemplos mais perigosos
é o uso do celular ao dirigir. Um estudo concluiu que o simples ato de falar ao
telefone, sem enviar mensagens de texto, é suficiente para reduzir a velocidade
de reação dos motoristas na estrada.
E isso também é válido para as
tarefas menos arriscadas do dia a dia. Em um estudo, ouvir um simples sinal
sonoro de notificação fez com que os participantes apresentassem desempenho
muito inferior em uma determinada tarefa. Eles se saíram quase tão mal quanto
os participantes que falavam ou enviavam mensagens de texto no celular durante
o trabalho.
E não é apenas o uso do
celular que traz consequências. Sua simples presença pode afetar a forma como
pensamos.
Em outro estudo recente, os
pesquisadores pediram aos participantes que colocassem seus celulares ao lado
deles para que ficassem visíveis (sobre uma mesa, por exemplo), perto e fora de
vista (como em uma bolsa ou no próprio bolso) ou em outra sala. Em seguida, os
participantes realizaram uma série de tarefas para testar sua capacidade de
processar e relembrar informações, de se concentrar e de resolver problemas.
Concluiu-se que o desempenho
foi muito melhor quando os telefones estavam em outra sala e não próximos, quer
estivessem eles visíveis ou invisíveis, ligados ou não. O mesmo resultado foi
obtido até quando a maioria dos participantes afirmava não estar pensando
conscientemente nos seus aparelhos.
Aparentemente, a simples
proximidade do celular contribui para a “drenagem do cérebro”.
O nosso cérebro parece
trabalhar muito no subconsciente para inibir o desejo de verificar o celular ou
acompanhar constantemente o ambiente para saber se devemos pegar o telefone —
por exemplo, quando esperamos uma notificação. De qualquer forma, esse desvio
de atenção pode dificultar a realização de qualquer tarefa.
Os pesquisadores concluíram
que a única solução é colocar o aparelho em uma sala totalmente diferente.
Estas são as más notícias, ou
parte delas. Mas os pesquisadores concluíram mais recentemente que também pode
haver um lado positivo na nossa dependência do telefone celular.
É uma crença comum, por
exemplo, que depender do telefone para tudo atrofia nossa capacidade de
memória. Mas esta pode não ser uma conclusão tão simples.
Em um estudo recente,
voluntários receberam uma tela com círculos numerados que eles precisavam
arrastar para um lado ou para o outro. Quanto maior o número no círculo, mais
os voluntários receberiam se o movessem para o lado certo.
Metade dos participantes pôde
anotar na tela quais círculos deveriam ir para qual lado. A outra metade
precisou confiar apenas na memória.
É claro que o acesso aos
lembretes digitais ajudou no desempenho. O surpreendente foi que os
participantes que usavam os lembretes não recordavam melhor apenas os círculos
anotados (os que tinham valor mais alto), mas também os círculos que não haviam
sido registrados!
Os pesquisadores acreditam
que, ao confiar as informações mais importantes (os círculos de valor mais
alto) ao aparelho, a memória dos participantes ficava liberada para armazenar
as informações de menor valor.
A desvantagem foi que, quando
os participantes não tinham mais acesso aos lembretes, a lembrança dos círculos
de valor mais baixo persistiu, mas eles não conseguiam mais se lembrar dos
valores mais altos.
Muitos anos de pesquisa ainda
serão necessários para podermos saber exatamente o que a nossa dependência do
telefone celular está fazendo com a nossa força de vontade e com a nossa
cognição a longo prazo. Até lá, existe outro caminho para tentar reduzir seus
efeitos nocivos. E tem a ver com a forma como pensamos sobre o nosso cérebro.
Como meu antigo colega David
Robson escreveu no seu livro The Expectation Effect (“O efeito da expectativa”,
em tradução livre), pesquisas recentes questionaram a crença de que, se
exercitarmos nossa força de vontade de certa forma (por exemplo, resistindo subconscientemente
a verificar nosso celular), nós “esgotamos” nossas reservas gerais, o que
dificultaria substancialmente nossa concentração em outras tarefas.
Isso pode ser verdade, mas
Robson escreve que depende muito daquilo em que acreditamos.
Indivíduos que acreditam que o
nosso cérebro tem recursos “limitados” — ou seja, que pensam que resistir a uma
tentação diminua nossa resistência à próxima — de fato são mais propensos a
exibir este fenômeno durante os estudos.
Mas existem pessoas que acham
que, quanto mais resistirmos às tentações, mais fortalecemos nossa capacidade
de continuar resistindo – em outras palavras, que o nosso cérebro tem recursos
ilimitados. Para eles, exercer o autocontrole ou a fadiga mental em uma tarefa
não prejudica o nosso desempenho na tarefa seguinte.
O mais fascinante que é a
visão limitada ou ilimitada do cérebro, em grande parte, pode ser cultural. E
que as pessoas de países ocidentais podem ter maior tendência a acreditar que a
mente é limitada do que as que vivem em outras culturas, como a Índia, por
exemplo.
Mas o que podemos tirar de
tudo isso? Bem, para reduzir a quantidade de vezes que verifico meu celular,
vou praticar deixá-lo em outra sala.
Mas também vou me lembrar que
o meu cérebro tem mais recursos do que imagino – e que, sempre que eu resistir
à tentação de consultar meu celular, meu cérebro irá criar novos caminhos
neurais que vão tornar cada vez mais fácil resistir a esta e talvez a outras
tentações no futuro.