Neste domingo comemora-se o Dia Internacional da Síndrome de Down. Essa data 21 de março (ou  3-21), faz alusão à trissomia do 21, com a finalidade de conscientizar a sociedade para a inclusão da pessoa com síndrome de Down e dar visibilidade ao tema.

Nessa data especial, o Gente que Entende homenageia uma garota queridíssima, que desperta paixões, e sua mãe exemplar. Temos o prazer de publicar a história de vida e de amor acima de tudo de: Mary e Lindalva.

Quem vai contar tudo é a Lindalva. Teremos respostas importantes: como é receber a notícia que seu bebê nasceu com Down? Quais são as dificuldades? Como será que os pais reagem a tudo? Como é a vida da pessoa portadora da síndrome? E outras tantas.

Para quem ainda não conhece a guerreira Lindalva e a sua princesa Mary, é uma grande oportunidade de aprofundar o conhecimento no tema e de se encantar com a história de vida de Mary e sua família.

Lindalva conta em detalhes tudo, e fala de sua luta junto com Bertinho, seu marido e pai de Mary, para conquistar a alegria de ver a evolução da garota muito especial.

Pare o que estiver fazendo e leia essa linda história, esclareça dúvidas e vai entender essa síndrome de Down NÃO é uma doença. Vamos lá!

 

“Meu nome é Lindalva Correia Gomes Dainez, nasci em Toledo - PR em 14/12/1973, sou a caçula de onze filhos de Silvino Peniche Gomes e Amélia Correia Gomes (ambos falecidos).  Porém, me considero tieteense de alma e coração, pois moro em Tietê há 42 anos, amo essa cidade e não trocaria por nenhuma outra para viver com minha família.

Sou casada com Bertinho Dainez há 16 anos e mãe da Maryanna Gomes Dainez. Uma menina de 11 anos muito feliz com Síndrome de Down. Sou assistente social e prós- graduando em Serviço Social na Educação. Trabalho como Assistente Social na Associação Viva a Vida, entidade que assiste pessoas com câncer em Tietê.

Sempre quis ser mãe, para mim era muito mais que um desejo, era o meu maior sonho e depois de dois anos de casados começamos as tentativas e nada. Foram anos de tratamentos e frustrações, até que decidimos parar com tudo, meu marido não suportava mais me ver sofrer e isso já estava afetando nosso relacionamento. Então decidimos que mais tarde tentaríamos talvez uma inseminação, mas falei se eu tiver que engravidar um dia seria pela misericórdia de Deus e esquecemos o assunto.

Um ano depois Deus me abençoou com a tão sonhada gravidez, eu nem acreditei quando vi o resultado positivo, minhas pernas tremiam e meu coração disparava de tanta felicidade. Tive uma gravidez super tranquila, curti cada centímetro que minha barriga crescia, cada movimento dela era uma festa. Todos os exames sempre ótimos, pressão arterial excelente, apesar de ter engordado 20 quilos, pois a única coisa que senti na gravidez foi uma fome de adolescente em fase de crescimento.

Lembro que em um dos ultrassons a obstetra me disse que aparentemente pela medida da nuca ela podia afirmar com 80% de segurança que o bebê não tinha síndrome de down, mas que se eu quisesse ter certeza precisaria fazer um exame chamado Amniocentese, mas esse exame era invasivo e corria um risco de 5% de sofrer um aborto. Eu imediatamente respondi que não faria e que se por ventura ela tivesse a síndrome de down, eu a queria da mesma forma, porque ela já fazia parte de mim e eu já a amava muito.  Depois fiz o exame morfológico que também mostrava que estava tudo bem. Segui minha gravidez muito feliz e ansiosa pela chegada da minha tão esperada princesinha, afinal eu iria realizar o meu maior sonho e estávamos muito felizes.

Já estava de 39 semanas quando comecei sentir as primeiras contrações, queria muito o parto normal, tinha lido vários livros sobre o assunto e me julgava preparada para passar por essa experiência linda. Por volta das 19h00min como combinado com a obstetra, fui para o Hospital com muitas contrações, mais infelizmente eu não tive dilatação suficiente e tive que fazer uma cesariana.

Enfim, meu sonho tornou-se realidade no dia 28 de junho de 2009, às 11h04min da noite. Lembro-me de ter entrado no centro cirúrgico, lembro-me da anestesia, de sentir quando a tiraram e de dentro de mim e de ver rapidamente quando a pediatra a estava aspirando, lembro-me do seu chorinho e mais nada.

Sinceramente não me lembro de terem me mostrado a minha filha depois do parto, e isso ainda me deixa triste, não vivi um momento com o qual sonhei minha vida inteira.

Só fiquei sabendo de como meu marido foi informado sobre a Maryanna ter síndrome de down depois, o que me causou muita decepção e revolta. Não foi à toa que ele desenvolveu a síndrome do pânico logo em seguida ao nascimento da nossa filha, pois como gestor financeiro de uma instituição bancaria, ele já tinha um trabalho extremamente estressaste e a forma despreparada com deram a noticia tinha que deixar alguma sequela.

Meu marido e os padrinhos da nossa filha, aguardavam na porta do centro cirúrgico, quando a pediatra que infelizmente nem conhecíamos, veio conversar com eles e disse exatamente assim:  Quem é o pai da criança?, meu marido se identificou, então ela despejou: sua mulher está bem, mas sua filha nasceu “cheia de problemas”. Ele foi ficando pálido disse que achou que iria desmaiar, e ela continuou; sua filha nasceu com síndrome de down e “portadores” dessa síndrome também apresentam vários outros problemas, inclusive problemas no coração. Meu marido ficou tão atordoado que nem conseguiu lembrar o que era a síndrome de down e inocentemente perguntou doutora essa síndrome de down tem cura? Ela irônica respondeu você não sabe o que é? Venha comigo que vou te mostrar. Então o levou até a nossa filha e disse: repare ela tem as orelhas mais baixas, os olhos puxados, às mãos com uma única prega, entre outras coisas que foi enumerando e ele ali ouvindo tudo completamente estático. E por último disse: conte para sua mulher antes que ela veja a criança e chame um ortopedista para avaliar se a criança tem movimentos nas pernas. E foi dessa forma que uma profissional totalmente despreparada deu a noticia para o meu marido praticamente no corredor do hospital. A essa altura ele não conseguia nem falar, então pediu a Gisele Macário madrinha da Maryanna que me desse tão dolorosa noticia.

Quando acordei já estava no quarto, onde estavam meu marido, e os padrinhos da Maryanna, todos com um semblante muito triste, eu olhei no berço do quarto e não vi minha filha e cheguei a pensar que ela havia falecido. Foi aí que a madrinha da Mary me disse: Li está tudo bem com a Maryanna ela é linda viu, mas ela nasceu com síndrome de down. Nesse momento parecia que tudo tinha desabado sobre a minha cabeça, eu não conseguia acreditar, a minha primeira reação foi me perguntar por que comigo, justo eu que queria tanto ser mãe, por que comigo?

Chorei muito, fiquei muito triste, era como se aquela dor, aquela tristeza nunca fossem passar. Meu marido ficou a noite toda ao meu lado, segurando na minha mão me dando apoio e carinho, mas percebi que no fundo ele estava muito pior do que eu e pedi pra que ele fosse para casa descansar, disse que ficaria bem, mas na realidade acho que precisava ficar um pouco sozinha para tentar digerir aquela inesperada noticia.

Não consegui descansar, só ficava imaginando por que ainda não tinham trazido a neném para ficar comigo, como eu ouvia tantas amigas dizerem que amamentaram seus bebes logos depois do parto eu esperava que comigo fosse assim também, mas nada, só aquele silêncio horrível de hospital.

Só a trouxeram às nove da manhã, depois de muita insistência minha, ela já com soro no bracinho, porque teve hipoglicemia. Ela era tão pequenina, tão magrinha, tão frágil, eu a segurei, fiquei olhando para o seu rostinho e um turbilhão de sentimentos tomou conta de mim, sentia medo, angustia e insegurança, mas também sabia que já amava aquela criança desde antes de ser concebida. Tentei dar o peito, mas ela não conseguia sugar, os bebês com síndrome de down na maioria tem hipotonia muscular e isso dificulta o movimento de sucção, eu insistia e nada, então comecei a ficar mais nervosa. Para piorar, ela apresentou um quadro de icterícia, foi ficando bem amarelinha e precisou tomar banho de luz, e para isso tinha que ficar sem roupas, e justo naquela semana chovia e fazia muito frio.

Quando eu olhava para aquela bebezinha tão frágil, sem roupas, naquele frio, apesar do berço ser aquecido eu sempre achava que ela poderia ter uma hipotermia e isso me deixava ainda mais triste.

Foram sete dias de internação, chorei muito, muito mesmo, pensava como seria seu futuro, pensava em todos os planos que havíamos feito, pensava em como seria educar uma criança especial, como seria lidar com o preconceito, não queria que ela sofresse com isso e me sentia impotente e cada vez ficava mais angustiada.

Eu sempre fui uma pessoa que tive muita fé em Deus, mas naquele momento não conseguia nem orar, só tinha vontade de chorar. E em meios às lágrimas eu só consegui dizer, Senhor eu aceito a minha filha, mas me fortalece para poder cuidar dela, porque acho que não vou conseguir.

Então aos poucos não me senti mais sozinha, lembrei que além de um marido amoroso e companheiro eu também tinha uma família maravilhosa, amigos e principalmente um Deus misericordioso que me amava e também estava ao meu lado. E eu, em meio a minha dor e ao luto da criança “perfeita” que eu esperava e não veio, havia me esquecido disso.

Fui me sentindo mais calma e confiante, fui recuperando a minha fé, lembrando que fui criada pela mulher mais forte que conheci na vida, e ela sempre me ensinou o poder da fé e da oração e foi essa mesma fé em Deus que me sustentou e me fez reagir. Parei de ficar me questionando por que, por que, comigo e passei a pensar por que não comigo?  

E senti no fundo do meu coração, que se Deus havia me escolhido, é porque sabia que eu teria capacidade para honrar o presente que Ele havia me confiado, e eu não o decepcionaria.

Naquele momento eu precisava superar tudo aquilo porque minha filha precisava de mim, enxuguei as minhas lagrimas e toda aquela tristeza e dor se transformaram em força e em um amor tão forte que nunca imaginei que um dia eu pudesse sentir!

Comecei a tirar o leite do peito de dar para ela com uma seringa, no começo cinco ml, depois dez, quinze e ela foi se fortalecendo. Eu dormia muito pouco queria estar sempre atenda, queria que ela sentisse que não estava sozinha que a mamãe estava ali com ela e que ela iria vencer!

Tivemos alta, fomos para casa, eu estava exausta, com a cesariana inflamada e um pouco aberta, os pés inchados de tanto ficar em pé ao lado do berço, mas muito feliz em ir para casa com a nossa princesinha.

Todos os dias eu ficava horas tentando fazê-la pegar o peito e com exatamente 21 dias ela conseguiu, e sugava com força, com vontade. Foi uma emoção muito linda, meu marido estava viajando a trabalho e eu gritava ao telefone: amor a Maryanna está mamando no meu peito, e choramos juntos de tanta felicidade.

Essa foi a sua primeira conquista e ela mamou por quase dois anos e atribuo a isso a sua excelente saúde. Também temos um anjo em nossa vida chamado Dr. Moacir Angeli que foi quem atendeu a Mary no dia seguinte ao parto e nos tranquilizou, orientou e acolheu dizendo que nossa filha poderia ter uma vida normal, e até hoje ele é o pediatra da nossa filha a quem sempre atendeu com muito carinho e atenção e ela o chama carinhosamente Vovô Moacir.

Muito cedo começamos a nossa maratona a muitos especialistas de varias áreas, foram: geneticista, cardiologista, neuropediatra, oftalmologista, otorrino e graças a Deus só recebemos boas noticias, para honra e glória do Senhor! A estimulação precoce dos bebês com síndrome de down é extremamente importante e quanto mais cedo começar melhor. A Maryanna fez fisioterapia desde o primeiro mês de vida, fez também hidroterapia, terapia com a fonoaudióloga e a terapeuta ocupacional e aos três anos foi para equoterapia, onde ficou por quatro anos. Todas as terapias e os profissionais que a tenderam nessa trajetória foram muito importantes para o desenvolvimento dela, somos gratos e guardamos cada um em nossos corações, não vou citar nomes porque realmente foram muitos.

Mary começou a sentar aos nove meses, andou com um ano e oito meses, aos dois anos conseguimos o desfralde total, até mesmo para dormir. A pedido do neuropediatra ela também foi para a escolinha aos sete meses, ele disse que isso seria importante para o desenvolvimento dela e também para socialização e realmente foi muito bom, e desde então ela estuda em escola regular e está no 5º ano.

Os obstáculos que enfrentamos são muitos, sofremos por ela diante de algumas situações de preconceitos, às vezes choro sozinha, sou humana, mas não me desespero mais, aprendi que tenho que “brigar” por ela sempre que necessário, para que seus direitos sejam respeitados. 

E não posso reclamar de absolutamente nada, somente agradecer ao meu marido que ao contrário de muitos que abandonam suas esposas diante do nascimento de uma criança com deficiência, ficou cada dia mais ao meu lado me apoiando em absolutamente tudo. 

E nós dois agradecemos muito ao nosso maravilhoso Deus que sempre nos direciona e coloca tantas pessoas boas em nossas vidas para trabalhar com a nossa Mary! Minha filha é saudável, linda, inteligente, curiosa, ativa, arteira e quando digo arteira é ARTEIRA mesmo, mas também é extremamente amorosa, gentil, adora nadar e brincar.  Ela é perfeita para nós e tem nos ensinado muita coisa!  

Ela acorda sempre feliz e vem para nossa cama nos dar bom dia e dizer que quer ganhar dez mil beijos e isso é a melhor coisa do mundo, mesmo quando ela vem às cinco da manhã. Mary sempre foi muito determinada e desde cedo a ensinamos a não desistir, sempre afirmamos que ela era capaz de fazer tudo que quisesse. Ela não tem nenhuma comorbidade relacionada a síndrome de down, nunca sequer precisou ficar hospitalizada nesses 11 anos. Com toda certeza as pessoas com síndrome de down podem ir muito longe e só precisam de amor, de estimulo e de apoio e de respeito.

É importante frisar que a síndrome de down não é uma doença, e sim um acidente genético, que acontece na divisão celular, que resulta em um par a mais no cromossomo 21; a síndrome de down não tem graus, mas pode se apresentar de três maneiras diferentes sendo elas: Trissomia 21 simples (93-95% dos casos): Todas as células do indivíduo têm 47 cromossomos ( é o caso da Mary); Translocação (4-6% dos casos): O cromossomo extra do par 21 fica aderido a outro cromossomo; Mosaico (1-3% dos casos): Apenas parte das células é afetada pela alteração genética, ficando algumas com 47 cromossomos e outras com 46.

Mas para o desenvolvimento da criança não importa o tipo de síndrome e sim a estimulação precoce, o amor e o apoio da família e da sociedade.  A síndrome de down é detectada através de um exame chamado cariótipo, que é a representação do conjunto de cromossomos de uma célula.

Tenho plena certeza que as pessoas com síndrome de down são inteiramente capazes de desenvolver suas habilidades e serem cidadãos inclusos na sociedade de forma efetiva. Podem fazer tudo aquilo que desejarem se receberem desde muito cedo um suporte para isso.  

Reforço que a estimulação é a chave para o bom desenvolvimento da pessoa com síndrome de down e deve ser feita desde o nascimento, procurar integrar a criança na família e em grupos de crianças da mesma idade é muito importante.

Mas, também é essencial estimular a autonomia, incentive a pessoa com síndrome de down a se comunicar, deixe-a perguntar, deixe-a responder quando é perguntada, incentive e ajude ler e escrever. Ajude-a aprender a cuidar de si mesma, da casa e a orientar-se nas ruas.

Desde pequena, é preciso que ela acredite que é capaz de ser independente, ser autônomo é importante demais para a autoestima, na idade certa é muito bom que aprenda algum oficio que se possível trabalhe e sinta-se independente.

Acredito que todas as barreiras podem ser superadas, cada uma ao seu tempo! Quanto ao futuro que eu me preocupava tanto, há tempos entendi que ele é incerto para todos nós.

Então vamos amar muito nossos filhos, curtir cada momento, cada fase, cada conquista e olha que são muitas. Já o futuro, vamos deixar nas mãos de Deus que sabe exatamente o que cada um de nós realmente precisa! Para nossa filha só almejamos que continue sendo feliz, que tenha autonomia e continue se sentindo amada e aceita!

Agradeço pelo convite e por poder dividir um pouquinho da nossa trajetória, e aproveito para me colocar a disposição das famílias que de alguma maneira eu possa ajudar nessa jornada árdua, mas também maravilhosa de ser mãe especial!

E por toda essa história, linda e emocionante, que nós ensina e muito sobre o AMOR e a SUPERAÇÃO, o GNTC afirma que Mary, Lindalva e Bertinho, são Gente que Entende de ....AMOR ESPECIAL.