Evaldo Cabral de Mello é um importante historiador e escritor brasileiro que, nascido em 1936 em Pernambuco, ao lado de seu trabalho de diplomata desenvolve interessantes estudos sobre a sociedade pernambucana no Brasil Colônia.

Dentre seus livros pode-se destacar “O NOME E O SANGUE – uma parábola familiar no Pernambuco colonial”, onde o autor conta a história das lutas, rivalidades e manipulações feitas com o objetivo de conseguir títulos e posições de prestígio, no Pernambuco colonial.

Evaldo Cabral de Mello trata, em seu livro, da história de um rico senhor pernambucano chamado Felipe Pais Barreto, que pretendeu ser aceito na importante Ordem de Cristo, naquela época, uma grande honraria.

Ao reconstruir os caminhos que um pedido de ingresso na Ordem de Cristo necessitava percorrer, o autor trata da história da capitânia de Pernambuco, relata os conflitos entre a aristocracia rural e os mercadores urbanos e mostra a força do antissemitismo e da inquisição.

Para habilitar alguém ao importante título de cavaleiro da Ordem de Cristo abria-se um processo, realizava-se estudo sobre a genealogia do interessado, buscavam-se detalhes sobre a vida do pretendente ao cargo, bem como sobre a vida de seus ascendentes, enfim, era um procedimento muito complexo.

No livro “O NOME E O SANGUE – uma parábola familiar no Pernambuco colonial”, o autor explica que: “A investigação destinava-se a determinar se o candidato tinha “defeito de sangue”, isto é, se descendia de mouro, judeu, preto ou índio, ou se incorria em “defeito mecânico”, vale dizer, se era filho ou neto de indivíduo que exercera atividade ou ofício manual ou se vivera ele próprio deste mister”.

Preconceitos inaceitáveis eram, naquele tempo, levados em consideração e acabavam por impedir que pessoas de origem judaica, africana, indígena ou que viessem de uma condição econômica menos privilegiada, no caso, trabalhadores em ofícios mais simples, tivessem negada sua entrada em cargos de alto prestígio ou de grande honraria, como era o caso da Ordem de Cristo.

Como o sargento-mor Felipe Pais Barreto pretendia ser cavaleiro da Ordem de Cristo, sua vida e a de seus antepassados foram exaustivamente analisadas, de acordo com as regras previstas para alcançar tal título, considerando que não eram aceitos candidatos com o já citado “defeito de sangue” ou “defeito mecânico”.

No caso de Felipe Pais Barreto, que era um homem rico e já ocupava cargos importantes no Brasil Colônia, os depoimentos tomados informavam que o mesmo seria descendente, pelo lado materno, de cristãos-novos, ou seja, antigos judeus que haviam se convertido ao catolicismo.

Felipe Pais Barreto buscou negar qualquer origem, ainda que distante, de judeus e alegou que seus familiares não pertenciam a nenhum ramo judaico, que houvera confusão por existirem pessoas com o mesmo nome, mas não eram de sua família, e que tais informações eram falsas.

O motivo de tanta preocupação, além da impossibilidade de ser admitido na Ordem de Cristo, era que sendo considerado descendente de cristãos-novos, ou seja, judeus conversos, Felipe Pais Barreto e sua família ficariam sujeitos a muitas perseguições e humilhações, dado o forte antissemitismo reinante.

Os tempos eram difíceis, entre 1710 e 1711 ocorreu a Guerra dos Mascates que colocou em conflito senhores de engenho de Olinda e comerciantes portugueses de Recife atrasando, ainda mais, a finalização do processo de Felipe Pais Barreto que, desde 1700, buscava aprovação para alcançar o tão desejado título de cavaleiro da Ordem de Cristo.

Os esforços foram em vão, Felipe Pais Barreto não conseguiu o almejado título de cavaleiro da Ordem de Cristo, mas, como escreveu o historiador os relatos do processo de Felipe Pais Barreto mostram, por outro lado, “[...] uma realidade há muito silenciada: o sangue cristão-novo que corria nas veias dos nossos antepassados”.

Finalmente, o livro “O NOME E O SANGUE – uma parábola familiar no Pernambuco colonial”, escrito por Evaldo Cabral de Mello, mais do que relatar as peripécias de um rico senhor pernambucano na busca do título de cavaleiro da Ordem de Cristo, consegue lançar novas luzes sobre as múltiplas origens, inclusive judaicas, dos primeiros povoadores do Brasil Colônia.