Temos
visto uma grande polarização por aqui, em que pessoas se unem em
grupos – ou bolhas, para usar o termo da vez –, defendem suas
posições políticas e seus valores com firmeza e atacam seus
“adversários”, ou seja, os que pensam e professam posições
diferentes.
O palco das contendas? As redes sociais! Um
fenômeno que o só corre por aqui? Não, um fenômeno mundial,
segundo dizem. Há culpados? As redes socias? A ver...
Com
efeito, as redes sociais servem de arena para que os divergentes se
encontrem e se enfrentem diretamente. Mas e antes das redes sociais,
as pessoas já não divergiam?
Parece-me que o que ocorreu foi
algo mais ou menos assim: antes, todo mundo tinha um galinheiro no
quintal e lá os seus galos brigavam apenas entre si, até que um dia
alguém criou uma rinha, ou seja, um ringue destinado à briga de
galos. A partir daí, os galos brigões puderam enfrentar os seus
similares de muitos outros galinheiros.
Antes das redes sociais,
as pessoas já discutiam, mas o faziam dentro de um universo pequeno,
formado por familiares e amigos próximos. Ora, ninguém (ou quase
ninguém) se levantava da mesa de um bar para sentar-se entre pessoas
com as quais não tinha intimidade para discutir política, religião
e demais pautas de costume.
As redes sociais, contudo, tiveram
o condão de nos colocar todos juntos numa mesma mesa de bar, entre
amigos, conhecidos, desconhecidos e até desafetos.
Essa foi
grande mudança que o nosso estágio tecnológico nos impôs, quero
crer. A nossa roda de convívio, com a qual estávamos acostumados a
lidar, passou a ser gigante.
Além disso, essa roda social
gigante em que vimemos nos pôs diante de desconhecidos, de pessoas
com as quais jamais teríamos interesse ou mesmo coragem de debater
questões de cunho mais pessoal. E essa coragem de “enfrentarmos”
esses nossos “novos amigos” creio que decorra do sentimento de
naturalidade que experimentamos, uma vez que agora o nosso universo
de convivência é muito maior.
Além disso, suponho que o
nosso desprendimento, a nossa valentia de dizer o que pensamos e até
de agredir os outros pelas redes (coisa muito comum) vem do fato de
nos imaginarmos protegidos. Afinal, é da segurança da nossa casa,
do conforto do nosso sofá que nos relacionamos, primeiramente com
uma máquina (vale destacar), e, por intermédio dela, ou seja, de
forma apenas indireta, com os outros. E tudo isso dentro de um
universo mágico, virtual, mais parecido com uma ficção do que com
a realidade, e que está sob o nosso absoluto controle: basta
bloquear a pessoa, apagar a postagem, desligar o celular e tudo se
apaga, tudo se esvai como se nada tivesse acontecido (como se ninguém
tivesse sido ofendido, ninguém tivesse tentado falsear a verdade,
etc.). Enfim, nos sentimos diante de um game e não no mundo real.
Em
resumo, acho a polarização não é novidade e continua como “dantes
no mundo de Abrantes”. O que mudou foi que a tecnologia nos inseriu
dentro de um mundo muito maior: o universo virtual. E estamos
aprendendo a conviver nesse mundo e, como é comum em todo processo
de aprendizado, ainda “batendo cabeça”. Mas, medida em que
formos aprendendo e entendendo que, apesar não parecer, o mundo
virtual é também o mundo real, que o mundo, enfim, é um só, não
vamos mais sentar na mesa de desconhecidos e, se o fizermos,
manteremos a postura que sempre mantivemos no mundo analógico.
A ver!