A história começa numa choperia chamada “Prosit” (“saúde”, em alemão). Ficava ao lado do mercado municipal e hoje nem existe mais. Foi na noite de um dia de semana qualquer que eu e um grande amigo nos encontramos lá. 

Depois do terceiro chope lembrei-me da minha esposa e do trabalho no dia seguinte e consultei o relógio (cedo ainda), mas é depois do quarto copo que o tempo fica esquecido em algum canto até que o garçom avise que o bar vai fechar…

Quando abri a porta do carro levei um susto tremendo: havia uma pessoa ali, quase deitada no chão, debaixo do carro, a 30 cm de mim, me olhando, olhos esbugalhados, ainda mais assustada do que eu! 

Dei um grito: “O que é isso? O que você está fazendo aí? E a pessoa respondeu, gaguejando: “estou fazendo cocô”… “O que? Saia já debaixo do meu carro!”, gritei, e ele saiu rastejando.

Era um mendigo que morava na rua, em frente ao mercado municipal, uma pobre alma que vivia da compaixão de alguns. Passado o susto, senti pena é culpa por ter sido ríspido, mas também muito alívio: no deserto das duas da madrugada eu seria uma presa fácil. Dei a partida, saí e logo depois senti um cheiro de cocô. “Nossa! Ele estava mesmo fazendo cocô, credo! E o cheiro ainda entrou no carro!” Abri todos os vidros e acelerei. 

Entrei em casa pianinho. Fui até o quarto conferir e minha mulher dormia feito pedra (“Ufa!”). Fui fazer xixi, fui à cozinha, bebi água, voltei pra sala e de repente me veio aquele cheiro horroroso de novo. “Não é possível!”, pressenti. Dito e feito: olhei para o chão e havia merda pra todo lado, na cozinha, no tapete da sala, no corredor, no banheiro. Mais que horror, o sentimento que me tomou decorria da junção do pânico e do nojo! Quase vomitei! Fora o frio na espinha ao imaginar o que seria de mim se minha mulher acordasse e visse a cena. 

 Então decidi agir rápido: fechei a porta do quarto (não pode entrar nem som, nem odor), tirei a camisa, peguei balde, água, escovão, pano de chão, detergente, desinfetante e comecei a limpeza. 

Não foi uma limpeza comum, naturalmente, mas um trabalho meticuloso, qual o do criminoso que volta ao local do crime para apagar os vestígios. 

Duas horas depois e o serviço estava completo e eu, exausto. “Agora finalmente eu poderia tomar um super banho e dormir”, pensei, até me lembrar de algo igualmente terrível: o carro! 

 Desci na garagem. O carro estava lastimável! Mais uma hora de serviços especializados para depois poder tomar banho e dormir lá pelas 5 da manhã e levantar às 8 para ir ao trabalho e chegar atrasado. E foi assim que, com muito empenho e dedicação, consegui salvar a minha vida e agora posso brindar esse fato com vocês.

 

Prosit!