A pandemia de covid-19 trouxe impactos para o atendimento em relação às doenças tropicais negligenciadas que passaram a registrar aumento da mortalidade, apesar da queda de internações.
Em 2020, a taxa de
mortalidade para malária subiu 82,55%, apesar da queda de 29,3% nas
internações. Doenças como a leishmaniose visceral e a leptospirose também
registraram aumento de mortalidade de 32,64% e 38,98%, respectivamente. O
número de internações por essas doenças diminuiu no período, com quedas de
32,87% e 43,59%.
Já a dengue registrou
aumento de 29,51% nas internações e de 14,26% na taxa de mortalidade. Os
dados fazem parte de um estudo dos pesquisadores Nikolas Lisboa Coda Dias e
Stefan Oliveira, da Universidade Federal de Uberlândia; e Álvaro A.
Faccini-Martínez, da Universidade de Córdoba.
Eles compararam os dados do
Sistema de Informações Hospitalares do Sistema Único de Saúde
(SIH/SUS) durante os primeiros oito meses de 2020 com os valores médios do
mesmo período dos anos de 2017 a 2019. Segundo os pesquisadores, a queda nas
internações é consequência da pandemia e do medo das pessoas de procurarem
assistência à saúde nesse período.
Na avaliação da Sociedade
Brasileira de Medicina Tropical (SBMT), houve aumento do número de casos dessas
enfermidades durante a pandemia. “Houve redução dos casos notificados e aumento
da letalidade”, disse à Agência Brasil o presidente da entidade,
Júlio Croda.
“Houve uma
desassistência às pessoas que são acometidas por essas doenças e que,
geralmente, são populações mais vulneráveis”, destacou.
Retrocesso
Na avaliação de Júlio Croda,
o Brasil retrocedeu de dez a 20 anos no combate a essas doenças. Segundo
ele, será necessário reconstruir os serviços de saúde já que todos os
programas nacionais de controle para essas doenças sofreram algum impacto. Ele
acredita ainda que a curva de redução de incidência que o país mantinha e de
mortalidade associada a essas doenças tende a entrar em estabilidade até 2030.
“A gente perdeu uma década
de combate a essas doenças, principalmente por conta da pandemia, da
desassistência, da falta de diagnóstico e de um tratamento precoce”, avaliou o
especialista.
Doenças esquecidas
As chamadas doenças
negligenciadas, ou esquecidas, são enfermidades infecciosas, muitas delas
parasitárias, que afetam principalmente as populações mais pobres e com acesso
limitado aos serviços de saúde, em especial pessoas que vivem em áreas rurais
remotas e favelas.
Segundo a OMS, elas integram
um grupo diversificado de 20 enfermidades prioritárias de origem parasitária,
bacteriana, viral e fúngica. Causam dor e incapacidade, criando consequências
sociais, econômicas e para a saúde duradouras para indivíduos e sociedades.
Impedem as crianças de ir à escola e os adultos de ir ao trabalho,
prendendo as comunidades em ciclos de pobreza e desigualdade. As pessoas
afetadas por deficiências causadas por essas doenças, muitas vezes sofrem
estigma em suas comunidades, dificultando acesso aos cuidados necessários e
levando ao isolamento social.
No Brasil, leishmaniose,
tuberculose, doença de Chagas, malária, esquistossomose, hepatites, filariose
linfática, dengue e hanseníase estão entre as principais doenças
negligenciadas. Elas ocorrem em quase todo o território. Mais de 90% dos casos
de malária ocorrem na Região Norte e há surtos de filariose linfática e
oncocercose. As regiões Norte e Nordeste apresentam o menor Índice de
Desenvolvimento Humano (IDH) e concentram o maior número das DTNs.
Equidade
A comemoração deste ano do
Dia Mundial das Doenças Tropicais Negligenciadas (DTNs) foi iniciada pela OMS
no último dia 26, sob o tema “Alcançar a equidade em saúde para acabar com a
negligência das doenças relacionadas à pobreza”. A instituição fez um apelo a
seus membros para que se concentrem no fortalecimento das intervenções, visando
promover serviços de saúde equitativos para todos.