Os adoçantes aspartame,
sacarina, estévia e sucralose impactam significativamente as microbiotas do nosso
corpo, notavelmente a microbiota intestinal, segundo um estudo publicado nesta
sexta-feira (19/8) na revista científica Cell.
No caso da sacarina e da
sucralose, há também um aumento relevante nos níveis de glicose — justamente
aquilo que o consumo desses itens frequentemente busca evitar.
Segundo a equipe de cientistas
responsável pelo estudo, os resultados mostram que os chamados adoçantes não
nutritivos (NNS) não são "inertes" no corpo humano, como se pensava,
e que é preciso cautela sobre o uso desses produtos, especialmente por pessoas
com doenças metabólicas como diabetes e obesidade.
Esses adoçantes não contêm ou
quase não contêm calorias e nutrientes, diferente dos açúcares adicionados ou
naturalmente existentes — nas frutas, por exemplo.
"Não podemos fazer uma recomendação
favorável ou contrária ao uso desses adoçantes, mas acreditamos sim que até que
mais estudos sejam realizados, a cautela é recomendada", escreveu por
e-mail à BBC News Brasil o líder do estudo, o médico e pesquisador Eran Elinav,
do Instituto Weizmann da Ciência, em Israel.
"É importante destacar
que nossos resultados não significam de forma alguma que o consumo de açúcar,
que é deletério à saúde humana conforme já mostraram muitos estudos, é superior
aos adoçantes não nutritivos. Acreditamos que o consumo de açúcar deve ser
evitado ou minimizado, especialmente por populações com propensão a ou sofrendo
de doenças metabólicas."
A pesquisa realizada foi do
tipo RCT, sigla em inglês para estudo clínico randomizado controlado,
considerado "padrão ouro" em pesquisas por seu rigor.
Em trabalhos assim, participam
dos testes pacientes (clínico), que são divididos aleatoriamente (randomizado)
em grupos — aqueles que recebem o tratamento em teste e aqueles alocados no
chamado grupo controle, que recebe outro tratamento para comparação ou placebo
(um medicamento inócuo).
Alterações intestinais
No caso da pesquisa publicada
na revista Cell, 120 voluntários que não tinham o hábito de consumir os
adoçantes não nutritivos foram divididos em seis grupos: dois grupos controles,
um grupo que ingeriu aspartame, outro sacarina, outro estévia e outro
sucralose.
Os grupos que consumiram os
adoçantes o fizeram durante duas semanas, incluindo na alimentação sachês em
uma quantidade abaixo do nível máximo recomendado diariamente.
As microbiotas são conjuntos de
bactérias, fungos e vírus geralmente benéficos que estão em diferentes partes
do nosso corpo, sendo a microbiota intestinal a maior delas, com trilhões de
micróbios vivendo ali.
Através da análise
metagenômica, que envolve o material genético desses micróbios, os cientistas
verificaram que cada adoçante impactou significativamente as microbiotas
intestinal e oral, enquanto os grupos controle não tiveram alterações
marcantes.
Eran Elinav explica que os adoçantes podem impactar as microbiotas inibindo ou estimulando o crescimento de alguma espécies, além de provocar alterações em fatores intermediários, como nos receptores de sabores doce ou amargo no intestino ou no sistema imunológico — que indiretamente afetam a microbiota.
Através de exames rotineiros,
os pesquisadores registraram que as pessoas que ingeriram sacarina e sucralose
tiveram um aumento significativo da glicose no sangue.
Em uma segunda etapa da
pesquisa, para provar uma causalidade entre a alteração na microbiota por conta
dos adoçantes e alterações nos níveis de glicose, a equipe usou cobaias.
Estas receberam transplantes
de fezes de 42 voluntários, ou seja, receberam parte da microbiota dos
participantes do estudo.
Os pesquisadores observaram
alterações semelhantes na microbiota e nos níveis de glicose de humanos e
cobaias. Logo, eles demonstraram que os adoçantes impactam a microbiota, e que
esta por sua vez também está relacionada aos níveis de glicose.
"A microbiota afeta a saúde
metabólica, incluindo as respostas glicêmicas, de várias maneiras. Por exemplo,
a microbiota pode modular a secreção de hormônios intestinais que afetam a
secreção e a sensibilidade à insulina", explica Elinav.
A BBC News Brasil perguntou
por que especificamente a sacarina e a sucralose levaram a um aumento da
glicose, mas não recebeu resposta para essa questão específica.
Em 2014, um estudo do
Instituto Weizmann da Ciência com cobaias já havia mostrado que adoçantes não
nutritivos poderiam levar a alterações no metabolismo da glicose. Agora, um
próximo passo, segundo o medico e pesquisador Eran Elinav, é ter estudos de
longo prazo acompanhando o impacto dos adoçantes nos níveis de glicose em
pessoas em risco ou diagnosticadas com diabetes.