Entre críticas e alguns parcos aplausos, o Supremo Tribunal Federal vai se encaminhando para formar maioria no sentido de descriminalizar o porte de maconha para uso pessoal. Embora o relator, Min. Gilmar Mendes, tenha proposto a descriminalização para todos os tipos de drogas, os demais ministros que votaram até o momento se limitaram a maconha.

A problemática em discussão na Suprema Corte precisa ser vista com cautela, sobretudo pelo significativo impacto e despreparo do Estado brasileiro para lidar com o assunto.

O primeiro ponto a ser destacado é que, a princípio, trata-se de uma indevida invasão do Judiciário no Legislativo, haja vista ser de competência do Congresso Nacional legislar sobre o assunto e promover as alterações legislativas necessárias. Não se pode negar a necessidade de uma modificação no texto legal, sobretudo em virtude dos flagrantes casos de injustiça que ocorrem no país por falta de parâmetros claros e objetivos para diferenciar o usuário do traficante, permitindo que exista verdadeira loteria ao se analisar os casos concretos.

Um outro ponto importante e, talvez, o que chame mais atenção é a falta de preparo do Brasil para partir para uma legalização do porte de maconha para consumo próprio. O Estado vai criar centros de venda e distribuição da droga? Vai impor taxas? O uso será permitido em qualquer lugar? Quem vai fiscalizar a produção e a distribuição?

Precisamos ter cautela na tomada de decisões, pois caso contrário o que se fará é dar um suporte maior aos traficantes e contribuir ainda mais com o uso nocivo da droga.

Não se trata simplesmente de legalizar o porte para consumo próprio, é preciso se ater as consequências que uma decisão dessa natureza irá gerar na sociedade, justamente por isso é que o assunto deveria ser discutido no âmbito do Congresso Nacional, por meio de estudos aprofundados, audiências públicas e discussões sobre como, quando e por onde começar a se preparar para uma eventual legalização.

Uma outra questão a se considerar é o impacto que a decisão acarretará para o próprio Poder Judiciário, uma vez que milhares de processos deverão ser revistos, centenas de presos serão postos em liberdade e um sistema que já opera lentamente em virtude da enorme carga processual, ficará ainda mais entupido com as incontáveis revisões criminais, habeas corpus e petições que chegarão às portas dos juízes e tribunais.

Em suma, é preciso reconhecer que o modelo atual está eivado de vícios e injustiças que precisam ser sanadas, não se pode aceitar como justo que um indivíduo preto e pobre seja considerado traficante com 30g de maconha enquanto o jovem branco que pertence a uma elevada classe social seja considerado usuário com 50g da mesma droga. Inclusive, o usuário é, de fato, um problema muito mais de saúde pública do que de direito penal. A revisão legislativa é urgente e se faz necessária, porém, o campo adequado para esse debate não pode ser o Judiciário, mas sim o Congresso Nacional, inclusive porque tal decisão pode e, provavelmente, irá gerar um aumento nas contas públicas com todo o aparato necessário para uma legalização responsável. Simplesmente legalizar não resolveria o problema, é preciso estratégia, sem a qual só teremos um aumento do problema no âmbito social e criminal.